29.6.06

O Universo da Feira

O Universo da Feira


O que seria um simples passeio pela feira de rua, comércio ambulante tradicional ainda nas cidades interioranas, pode despertar um novo olhar sobre este espaço de trocas aparentemente simples, e destituído de maiores significados. Dizemos aparentemente simples, com larga propriedade, posto que inúmeras relações sociais se efetivam neste tipo de comércio, como veremos a seguir. Buscando descobrir a magia da Feira, pressentimos um mundo todo a se revelar. “Conhecer as imagens que nos circundam significa também alargar as possibilidades de contato com a realidade; significa ver mais e perceber mais.”, seguimos, por conseguinte, as pegadas de Bruno Munari, designer italiano.

Um mundo inteiro se abre com novas possibilidades de apreensão e reconhecimento. Observando as linhas harmônicas dos trançados de palha – em chapéus, cestos, peneiras, ou ainda, atentando para a diversidade dos mesmos objetos apresentados em materiais distintos . Natural como o encontro dos antigos e tradicionais com os novos materiais, na confecção do mesmo produto, também são as tecnologias. A exemplificar: as coleiras de animais coloridas, feitas de nylon, e as tradicionais de anéis de metal ou couro.

O visual da Feira é outro aspecto relevante. As relações volumétricas que criam formas tridimensionais como a pilha de vassouras de palha ou de barbante, arrumadas de maneira simétrica, geram inusitados objetos. Há também a transformação de uma forma em outra, percebida no uso da bandeira nacional na sandália de borracha industrializada. Novas formas vão sendo construídas de maneira harmoniosa, cheias de mensagens visuais, compondo uma estética muito agradável aos olhos.

E o que dizer das cores e de seu uso? Para um designer, as cores corretas são as próprias dos materiais com que são produzidos os objetos, e ele as opera em sintonia com a ciência e a indústria, de acordo com Munari. O mesmo é percebido no universo dos feirantes, que ao invés de científico, eles operam com o conhecimento empírico. O vermelho latente e vibrante do colorau repousado na vitrine a céu aberto, quase que impossível não ser visto, contrastando com os raios de sol. Vendo-se as paredes de barracas, de colchas de retalhos de tecido, percebe-se que não há uma seleção simétrica de cor e padrão, porém que resultado primoroso.

E que exemplo mais exímio do que a seção de ervas - farmácia popular – e especiarias. As latas de alumínio que já guardaram leite em pó agora servem de suporte para a canela em bastão, pedras de enxofre, anis estrelado, tudo perfeitamente adequado. A disposição é no chão mesmo, protegido apenas pelo plástico preto, que contrasta com o prateado do alumínio.

A feira é esse universo mágico, democrático e contemporâneo. Mistura de formas, cores, materiais. Regido por sua gente e sua sabedoria.

É preciso estar atento, conhecer o que está vizinho, aprender a ver e ver sempre mais.




Luana E.G. Esmeraldo Barros


Domingo é dia de felicidade

Domingo é dia de visita. É dia de Dona Ana colocar o seu melhor vestido e passar lavanda no corpo. Seu Aurélio faz a barba e capricha na loção. No canto da varanda uma senhora se balança na cadeira, comentam que ela é um pouco arisca, mas disfarça bem ao ver alguém se aproximando. No jardim umas quatro senhoras entoam um “bendito”, se alegram ao ver as pessoas entrando e concluem que já está na hora das visitas.

Os olhos deles brilham, sorrisos largos e uma aparente ansiedade, deve ser pela chegada dos amigos ou algum parente. Percebem logo quando chega um desconhecido, e tratam imediatamente de ficar por perto. Querem contar suas histórias e sabem que vão ter alguém para ouvi-los. No rosto de cada um várias linhas, sinais do tempo, e muita história pra contar. Os olhos de dona Mariazinha marejam, ela lembra do irmão que um dia vivera junto ali. Mas ela não chora, apenas tenta contar sua história em troca de atenção.

As visitas vão chegando com as mãos ocupadas. Logo eles desconfiam do pacote, da cesta embrulhada num papel, da sacola de supermercado, já devem imaginar o que vem ali dentro. Certamente já haviam pedido ou insinuado. Eles adoram as bolachinhas de padaria que combinam muito bem com o café. A colônia também deve estar num daqueles pacotes. São muito vaidosos e gostam de estar perfumados.

Muitos não têm mais família, outros não a vê há tempos. Família agora é o lar onde vivem. É o companheiro da cama do lado. Lá recebem o carinho dos funcionários, alguns voluntários, das enfermeiras, dos profissionais de saúde que lhes prestam atendimento semanalmente, e das visitas muitas vezes de desconhecidos. Sentem-se importantes e queridos.

Por trás das linhas marcadas no rosto de cada um há muita história vivida. O brilho do olhar não representa mais o viço da juventude, mas ainda brilha para os amigos e desconhecidos que os visitam. Alegria é receber atenção, carinho, um sorriso. Para esses idosos o contentamento se completa nas coisas mais simples, basta sentirem-se amados, ouvidos e visitados.

Felicidade é o que muitos dos idosos do Lar Bezerra de Menezes sentem.



Luana E. G. Esmeraldo Barros

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